01/03/2013
Boletim Internacional de desenvolvimento local
sustentável
Boletim informativo #96
1º de março de 2013
Sumário
V º Simpósio
de URGENCI : Monterey, Califórnia, Estados Unidos, janeiro de 2013.
Para
uma microfinança solidária?
Mensagem da equipe editorial
A
oportunidade nos é dada de comunicar os desenvolvimentos de duas temáticas que
comentamos em publicações precedentes. Ambas testemunham da maturidade
crescente dos movimentos da sociedade civil, e de sua capacidade para fornecer
verdadeiras alternativas em termos de desenvolvimento local, ao mesmo tempo nos
países em via de desenvolvimento como nos países desenvolvidos.
Judith
está envolvida no movimento URGENCI desde faz agora vários anos. Como podemos
constatar, o último simpósio que aconteceu na Califórnia em janeiro passado
revela passos importantes que aconteceram estes últimos anos. O fato de que o
próximo acontecerá na China em 2015 ilustra os progressos consideráveis da
Agricultura sustentada pela comunidade (ASC) nos diversos continentes. Artigos
precedentes em #47 (2008) e #64 (2010).
Do seu
lado, Yvon enriqueceu seus conhecimentos em microfinança acompanhando a Sra.
Fatouma Barry da Caixa de poupança e crédito do setor pesqueiro na Guinée
(MÉCRÉPAG), durante uma viagem de estudos no Canadá em novembro passado. Além
disso, como ele é membro do Fundo de empréstimo Quebeque, ele acompanhou de
perto o projeto de criação de uma Caixa de microfinança. É a primeira vez que
isto acontece no Canadá. As duas caixas são portadoras de uma abordagem da microfinança
que nos permite esperar verdadeiras práticas solidárias, do gênero daquelas que
apresentamos no boletim #93 em novembro passado, concernindo a ASSEFA, na Índia.
Judith Hitchman
Yvon Poirier
Martine Theveniaut
V º Simpósio de URGENCI :
Monterey, Califórnia, Estados Unidos, janeiro de 2013
Por Jocelyn Parot
URGENCI, a
rede internacional da Agricultura apoiada pela comunidade (ASC), alcançou uma
nova etapa de maturidade, durante seu V º Simpósio bianual, que aconteceu de 20
a 23 de janeiro de 2013, em Monterey, na Califórnia. Os três primeiros
colóquios tinham acontecido na Europa – Aubagne, França (2004 e 2008) e
Palmela, Portugal (2005). Depois URGENCI organizara com sucesso a primeira
conferência internacional ASC fora da Europa, em Kobé, no Japão, em 2010.
Habitualmente, o Japão é considerado como o berço das parcerias locais e
solidárias entre produtores e consumidores (Teikei). Três anos mais adiante, a
conferência internacional de URGENCI aconteceu nos Estados Unidos, outro
bastião do movimento.
A contribuição de URGENCI ao
movimento americano das ASC
O movimento
americano das ASC conhece nos dias atuais uma nova fase, depois de um início
muito rápido nos meados dos anos 1980. Dizer que há mais de 6.000 ASC em nível
nacional (de acordo com as estimativas de Steve McFadden), ou até mais de
12.500 produtores agrícolas que comercializam sua produção sob forma de cestos
(conforme estimativas do ministério da agricultura dos Estados Unidos datando
de 2010), não é pertinente. Melhor seria entender, como observa Steve McFadden,
que as ASC nos Estados Unidos estão “numa
virada decisiva. Será que vão se tornar apenas um “business model” a mais, ou
seja, a troca de dinheiro contra alimentos? Ou então, as ASC vão conseguir
realizar seu potencial ideal: o de se tornar um modelo para parcerias mais
justas (social), mais resilientes (ambiental) e mais solidárias (econômico)?”
Será que os
sistemas de cestos de escala muito grande colocam em perigo o conceito de PLS?
Quem está apto a defender os princípios da Agricultura sustentada pela
Comunidade? Qual é o papel das redes locais para garantir a ética dos novos
modelos de ASC? Será que um ASC em que se associam vários produtores é
simplesmente um novo tipo de cooperativa alimentar?
Estas
questões estiveram no cerne das numerosas conversas que aconteceram durante as
visitas das fazendas no dia 22 de janeiro e durante as discussões e debates da
Conferência internacional no dia 23. A presença de agricultores e consumidores
vindos de outros horizontes (outros Estados americanos e outros continentes)
foi certamente benéfica para todos os participantes, pois estas questões são
recorrentes em todos os lugares onde a
prática das ASC é solidamente amarrada. Alguns movimentos bem estabelecidos já
adquiriram uma experiência preciosa para esclarecer diferentemente (não para
resolver) essas delicadas questões. Os participantes locais – na sua maioria
camponeses da agricultura orgânica – gostaram desta forma de compartilhar com
seus colegas estrangeiros.
Esta
conferência internacional sobre a Agricultura Sustentada pela Comunidade teve
por resultado imediato a instalação de uma coalizão estadunidense das ASC, e a
prefiguração de uma rede californiana das ASC. Isto graças ao forte
envolvimento da organização CAFF (Community
Alliance for Family Farmers, Aliança comunitária para os pequenos
produtores), que co-organizou a conferência com URGENCI. As duas estruturas têm
em comum colocar a parceria solidária entre consumidores e produtores no cerne
de suas ações. Portanto, é ao mesmo tempo em nível local e nacional que os
participantes na conferência internacional marcaram época!
Um resultado importante: a nova articulação da rede em grupos regionais
Os dois dias
precedendo a conferência e as visitas de fazendas, 25 representantes do
movimento da Agricultura Sustentada pela Comunidade de todas as partes do mundo
se encontraram durante a Assembleia Geral da rede para definir e elaborar um
plano de ação para os dois próximos anos. Pela primeira vez, os membros de
URGENCI redigiram planos de ação concretos a serem implementados nos cinco
continentes, com responsáveis de grupos regionais encarregados de sua
realização!
Shinji
Hashimoto (Japão) e Joy Daniel (Índia), dois membros da Ásia do Comitê
internacional de Urgenci durante as visitas de fazendas
A nova
Comissão internacional, que compreende oito pessoas, conta agora um membro da
América latina; e três enviados especiais, com funções específicas.
Elizabeth
Henderson, autora do famoso manual Sharing
the harvest (Repartindo a colheita)
que inspirou toda uma geração de agricultores e consumidores em toda parte no
mundo aceitou generosamente assumir a Presidência de Honra de URGENCI.
Elizabeth é uma agricultora aposentada, engajada há muito tempo nas lutas para
mais justiça social e apaixonada pela ASC de que ela é uma ardente embaixadora.
Trata-se de um justo reconhecimento de sua contribuição à URGENCI, e uma chance
para nossa rede de contar com ela oficialmente entre nós. Foi também decidido
que o próximo simpósio de URGENCI acontecerá na China em 2015.
Artigo
original em inglês traduzido em francês por Morgane Iserte.
FR-EN-PT-ES
http://blog.urgenci.net/
Para uma microfinança solidária?
Por Yvon Poirier
O microcrédito se tornou desde faz alguns
anos, sobretudo desde a atribuição do Prêmio Nobel a Muhammad Yunus em 2008,
uma atividade muito difundida em todos os continentes. De acordo com os
promotores do microcrédito, ele deveria ser a ferramenta permitindo ajudar as
pessoas a sair da pobreza, em especial as mulheres. Ora, uma constatação se
impõe cada vez mais, a saber, que não somente não é uma panaceia, mas que em
muitos casos, investidores se enriquecem junto aos pobres, e que seu
endividamento aumenta.
O ano passado, Milford Bateman apresentava
durante uma conferência no Canadá um resumo da tese defendida em seu livro Why
doesn’t microfinance work (Por que a micro finança não funciona)
publicado em 2010[1].
O subtítulo do volume é revelador de sua posição: o aumento destrutivo do
neoliberalismo local. Ele explica que, em muitos casos se não na maioria
dos casos, trata-se de armadilhas da pobreza. Escândalos na Índia, com métodos
de cobrança de tipo mafioso (chegando a provocar suicídios) são muito nocivos.
Além disso, ele indica que ele é cada vez menos considerado como ferramenta de
desenvolvimento, e que grandes instituições como o Banco Mundial não fazem mais
a sua promoção. Embora este livro provoque uma forte polêmica ele tem como
mérito colocar o dedo sobre problemas que já evocamos neste boletim.
O modelo dominante se baseou principalmente
numa oferta de crédito vindo de instituições externas, com a anuência de um
prêmio Nobel. Ora, outros optaram por implantar instituições para e pelas
próprias populações. Assim, quando o quadro jurídico toma a forma ajuda
mútua/cooperativista na qual os clientes são membros, e, portanto, associados à
governança, as respostas são verdadeiramente adaptadas às necessidades das
populações concernidas. Eis um resumo rápido de duas iniciativas deste tipo.
Fundada em 2006, a Caixa de poupança e crédito
do setor pesqueiro na Guiné (MÉCRÉPAG) é o resultado de uma associação com a
União nacional dos pescadores artesanais da Guiné. Em poucos anos, a MÉCRÉPAG
dispõe de cinco caixas locais, contando em 2012 com mais de 10 000 membros
individuais, dos quais cerca de 65% são mulheres. Os créditos concedidos
permitem aos pescadores equiparem os barcos de motores de popa, às mulheres
defumarem o peixe, ou então comprarem ou venderem nos mercados. Além disso,
formações tanto sobre a gestão de cooperativas locais, a salubridade, a gestão
dos empréstimos, etc. são oferecidas aos membros. As caixas locais, e a própria
caixa central são governadas por pessoas eleitas em assembleia pelos membros.
Durante uma visita no Canadá em novembro de
2012, Yvon Poirier, Gérald Arsenault e Robert Gallant da Cooperativa de
pescadores a Acadiana, Sra.Fatoumata Barry da MÉCREPAG
No Canadá, o microcrédito está presente na
maioria das regiões faz uns vinte anos. Até o momento, as organizações de
microcrédito eram estruturadas no modo de organismo sem fins lucrativos. Após
quinze anos de atividade, percebendo os limites deste modelo, o Fundo de
Empréstimo Quebeque (localizado na Cidade de Quebeque), decidiu se transformar
em caixa de poupança e crédito mútuos para oferecer empréstimos às populações
menos favorecidas, mas igualmente poupança e micro-seguro. Assim o Fundo de
empréstimo de Quebeque, uma organização relativamente pequena, desenvolveu um
projeto de lei que foi adotado pela Assembleia nacional do Quebeque em dezembro
de 2012. A nova Caixa de microfinança (Quebeque) é a primeira no Canadá. Na
nova organização, os clientes vão se tornar membros e vão poder eleger
representantes no Conselho de administração e votar nas Assembleias gerais, o
que não era facultado antes.
Embora os contextos socioeconômicos sejam
muito diferentes, esses dois exemplos ilustram que é possível criar
instituições por e para as pessoas concernidas, e que, além disso, elas podem
participar da gestão de sua instituição. É uma alternativa ao microcrédito,
que, na maioria dos países do mundo é proposta por organizações externas à
comunidade, e não depende portanto das próprias comunidades.
Em francês
Webinar FR-EN
A respeito do
boletim
Este boletim é publicado em : francês,
inglês, espanhol, português, japonês e língua indonésia. Ele é realizado de
forma totalmente voluntária desde o primeiro número publicado em 2003.
A equipe editorial quer agradecer as pessoas voluntárias
seguintes pelo seu engajamento na tradução e na revisão:
Michel Colin (Brasil)
Paula Garuz Naval (Irlanda)
Évéline Poirier (Canadá)
Brunilda Rafael (França)
Além disto,
gostaríamos de agradecer o Policy Research Institute for the Civil Sector (PRICS) do Seikatsu Club no Japão pela tradução para o japonês e AKSI
UI pela tradução para a língua indonésia.
Os boletins estão na internet em dois endereços.
http://developpementlocal.blogspot.com/
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