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02/12/2008

Boletim Internacional de Desenvolvimento Local Sustentável
Boletim Informativo #54

1° de dezembro de 2008

Sumário

Mensagem da equipe editorial


Mondragón Cooperative Corporation
Uma análise crítica das forças e fraquezas e potencialidades do modelo.

Declaração de Bamako
Para um turismo solidário, vetor de desenvolvimento sustentável dos territórios.

Encontro Internacional da Via Campesina, em Maputo, Moçambique.
Os desafios do movimento camponês mundial.

Mensagem da equipe editorial

A Mondragón Cooperative Corporation (MCC) é de fato conhecida como uma das maiores cooperativas industriais no mundo.
Judith Hitchman nos apresenta um artigo relativo ao seu encontro com o responsável da comunicação de MCC no mês de setembro passado. Não se trata de uma análise exaustiva dos desafios que o MCC enfrenta, mas ele nos ajuda a compreender os grandes desafios de governança e de gestão de uma cooperativa de grande tamanho, numa escala internacional.

Por outro lado, comunicamos a vocês os principais resultados de encontros dos quais Martine e Judith participaram: o Fórum Internacional do turismo solidário em Bamako (Mali) (FITS) e a quinta conferência internacional da Via Campesina em Maputo (Moçambique).

Como o próximo número será publicado somente em fevereiro de 2009, desejamos lhes apresentar nossos melhores votos e lhes desejar paz e prosperidade para o próximo ano. Formulamos também votos coletivos para que a gravidade da crise financeira, econômica, alimentar e ecológica determine os principais governantes a engajar a transformação radical da qual o mundo precisa. Que 2009 inicie saídas positivas é nosso voto mais profundo!

Equipe editorial
Judith Hitchman
Yvon Poirier
Martine Theveniaut


Mondragón Cooperative Corporation

Uma análise crítica das forças e fraquezas e potencialidades do modelo.


Muitas pessoas conhecem Mondragón, muitas vezes elogiado como o protótipo da cooperativa industrial de sucesso, em um mundo em que o modelo cooperativo é de forma geral identificado com os setores agrícolas ou dos serviços. Tivemos o privilégio recentemente de fazer uma visita na sede, onde passamos uma longa tarde em companhia de Mikel Lezamiz, o responsável da comunicação, que nos recebeu com muita cortesia.

Histórico
Em 1941, Don José Arizmendiarrieta chegou à pequena cidade de Mondragón, situado no centro do País Basco Espanhol. Em 1943, ele fundou a Escola Politécnica, e cerca de dez anos mais tarde, em 1956, a primeira cooperativa, ULGOT, onde se fabrica a marca de eletrodoméstico FAGOR. O primeiríssimo agrupamento de cooperativas (ULARCO-FAGOR) nasceu em 1964, seguido dois anos depois por um dos elementos mais inovadores, ALECOP, uma fábrica onde empregos em tempo parcial são reservados para estudantes, de forma a lhes permitir ganhar algo para continuar seus estudos. É preciso ter em mente que a Espanha de forma geral, e mais ainda esta região, é muito pobre naquela época, e que as pessoas estão apenas se livrando dos efeitos da guerra civil. Em 1974, nasceu um centro de pesquisa, e progressivamente o vasto império que a Mondragón Cooperative Corporation é hoje. A forma atual da estrutura MCC foi adotada pelo Congresso de 1991.

O que é Mondragón hoje, e como ela opera?
Mondragón constitui um verdadeiro império, composto por cerca de 103.000 pessoas, 120 cooperativas, cobrindo campos muito diversos de produtos, industriais, financeiros, bens de consumo, agricultura, educação, pesquisa e serviços sociais. As 69 fábricas de produção se encontram em numerosos países do mundo. Não são todas elas cooperativas, como o veremos mais adiante. No seio da cadeia de supermercados, EROSKI, os consumidores são também membros. Um comitê de higiene e de segurança existe em todas as cooperativas.

Conforme a declaração de princípio (mission statement):
Mondragón Cooperative Corporation (MCC) é uma entidade empresarial socioeconômica, fincando suas raízes profundas no País Basco, criada por e para as pessoas, inspirada pelos princípios fundamentais da experiência cooperativa, engajada em relação à comunidade para a melhoria da competitividade e a satisfação dos clientes. Seu objetivo é “criar riqueza no seio da sociedade pelo desenvolvimento empresarial e a criação de empregos em que as pessoas são membros das cooperativas”.

MCC se baseia sobre o engajamento solidário e utiliza métodos democráticos dentro de sua organização e de sua gestão. MCC encoraja a participação e a “integração das pessoas na gestão, nos lucros e no acionariado de suas empresas para desenvolver um projeto conjunto integrado que visa uma empresa social e o desenvolvimento pessoal”.

E 10 princípios fundadores subjacentes de cooperação:

1. Entrada aberta.
2. Organização democrática.
3. Soberania do trabalho.
4. Natureza subordinada e instrumental do capital.
5. Gestão participativa.
6. Solidariedade salarial.
7. Inter-cooperação.
8. Transformação social.
9. Universalidade.
10. Educação.

O custo de entrada no sistema cooperativo é de 14.000 €, uma quantia que é deduzida progressivamente dos salários sobre um longo período. Ser membro de uma das cooperativas do grupo abre o direito a uma participação correspondente a 20% dos lucros do conjunto, à adesão automática ao sistema complementar de saúde e de aposentadoria da empresa, a empréstimos com juros preferenciais. Representa também uma segurança de emprego relativamente grande. O nível de formação no decorrer da vida é elevado, conforme os 10% exigidos na Espanha. Um acesso à Universidade técnica, aos centros de formação para a gestão e para a lingüística são igualmente garantidos.

O primeiro elemento que me parece positivo é que, apesar do fato de ter-se tornado uma corporação multinacional, nenhuma deslocalização de cooperativas fora da Espanha ou do País Basco aconteceu, quer seja na indústria, nos supermercados, nos centros de pesquisa, nos bancos e nos serviços, onde 90% dos empregados são membros das cooperativas. Os outros empregados (muitas vezes menos de 5%) beneficiam de certa “flexisegurança”. Em 2007, 10 cooperativas tiveram perdas. Em 2008 será pelo menos o dobro. Várias empresas do grupo tendo atualmente o estatuto clássico de acionariado estão prestes a tornar-se agora cooperativas.

Quais são as forças e as fraquezas do modelo?
Eu tentei examinar o grau de implementação dessas práticas à luz da economia solidária que visa à criação de uma riqueza e de um bem-estar coletivo, para ver como uma empresa multinacional pode ser de fato colocada a serviço dos interesses locais e das pessoas.

Frente à questão delicada sobre a origem dos produtos, sobretudo nos supermercados EROSKI, e sabendo que a agricultura intensiva no Sul da Espanha pode ser um equivalente moderno da escravatura, eu soube que a cadeia recebera a certificação SA8000 há dois anos. O que quer dizer que os direitos humanos são respeitados, assim como o trabalho decente (inclusive nos fornecedores). Nenhum trabalho é realizado por crianças. A certificação não cobre todos os produtos, porém o processo está realmente em curso. A cooperativa FAGOR utiliza os mesmos processos de SA8000, mesmo se eles não ainda certificados.

Ter uma atitude de cooperação é também partilhar os riscos e aceitar as reduções de salário em tempo de recessão. Com a recessão mundial, haverá certamente empregos a menos, quer isto aconteça na Espanha ou em outra parte.

Entretanto, numerosas fábricas que se encontram pelo mundo afora não são cooperativas. As diferenças culturais na aceitação do estilo universal de gestão participação e os princípios de cooperação parecem ser as causas principais disto. Mas existe um elemento positivo: os fluxos tensos de entrega de peças entregues em domicílio fazem que a marca carbono da empresa seja das melhores. Muitas destas empresas apenas passaram da fase inicial, e não conseguem ainda ter lucros. Existe uma transparência da informação, uma tentativa de construir um mesmo estilo de gestão, e 30% das partes pertencem aos assalariados. Fica difícil instalar uma redistribuição dos benefícios porque não existe cultura da poupança em numerosos países, o que torna a participação simples aos benefícios mais complicada. A implementação de programas de saúde e de aposentadoria tem um impacto mais importante. Vale também mencionar o fato que os salários ultrapassam em 10% o salário mínimo em cada país. No entanto, isto levanta a questão dos limites culturais do modelo, mesmo se a filosofia permanece íntegra.

Tudo isto demonstra uma RSE (Responsabilidade Social da Empresa) muito
importante. Existe uma vontade declarada de respeitar os Direitos do Ser Humano, assim como a legislação, a dignidade, o respeito e a transparência. O modelo da boa governança está baseado nos princípios da inter-cooperação e do controle dos trabalhadores.

Uma questão fica sem resposta : a da não-existência de sindicatos.
Apesar do princípio da cooperação, « um homem, uma voz », que confere uma representação democrática clara, o papel de um sindicato ultrapassa o da simples representação. Especialmente quando os tempos ficam difíceis. Os sindicatos permitem também aos trabalhadores permanecer em relação com o mundo exterior a sua empresa e setor.

No final das contas, em uma empresa de dimensão internacional, cuja venda dos produtos depende do consumismo, e do “sempre mais” a questão fica colocada sobre os verdadeiros limites que este sistema porta, de forma intrínseca. Será que o modelo atual poderá continuar e transformar a sociedade para que haja uma abordagem mais racional da utilização de todas as coisas? Ou então, será que o laço estreito da produção dos bens com o modelo de uma sociedade capitalista e neoliberal vai provocar a queda do que é sem dúvidas uma tentativa única de partilhar os benefícios da atividade com a base? Como o expressou Mikel Lezamiz: “Não somos anjos...”?

Autor : Judith Hitchman
http://www.mcc.es/


Declaração de Bamako

Para um turismo solidário vetor de desenvolvimento sustentável dos territórios.


O 3° Fórum Internacional do turismo solidário (FITS), reunido em Bamako, no Mali, do 20 ao 22 de outubro de 2008, precedido pelas oficinas de campo de três dias, se encerrou com uma declaração da qual vocês vão encontrar abaixo o essencial.

“As oficinas como as mesas-redondas mostraram a importância de privilegiar, em um objetivo de desenvolvimento, uma abordagem territorial na qual o Turismo Solidário pode ocupar um lugar determinante.

O desafio deste desenvolvimento consiste tanto em contribuir para melhorar a qualidade de vida dos homens vivendo nestes territórios quanto para preservar os recursos naturais. Além das diferentes expressões utilizadas para designar o “turismo solidário”, este deve integrar, de forma determinada, este objetivo de desenvolvimento sustentável.

Os atores e os parceiros do Turismo Solidário são convidados a se referir ao quadro e aos valores do que chamamos hoje de economia social ou solidária, levando em conta especificidades dos países ou regiões do mundo.

Alguns grandes eixos operacionais parecem prioritários para alcançar o objetivo de desenvolvimento sustentável mediante um Turismo Solidário:

• Obter dos poderes públicos um maior apoio político acerca do turismo solidário
• Criar ou precisar os quadros legislativos e regulatórios adaptados ao Turismo Solidário
• Favorecer o compromisso dos governos locais e regionais
• Inscrever o Turismo Solidário em uma abordagem complementar do conjunto das atividades do território
• Desenvolver e reforçar os meios de apoio (formação, financiamento, acompanhamento,...)
• Incentivar a estruturação e a construção de redes dos atores e dos territórios privilegiando as estruturas existentes para evitar a dispersão das iniciativas.
• Assegurar uma oferta de Turismo Solidário de qualidade que seja adaptada às expectativas das clientelas
• Determinar melhores condições de integração ao mercado

É preciso agora passar juntos do dizer ao fazer: esta é a ambição que declaramos no encerramento deste 3° Fórum, conscientes da obrigação ingente que temos agora de alcançar os objetivos que nos reúnem”.

Martine Theveniaut e Alain Laurent, participantes do FITS e da oficina de Teriya Bugu.
Ver o relatório desta oficina no site (em construção):
http://www.pactes-locaux.org
Ver: Base de fichas. Esfera: pactes; Identificador: INV ; senha: pactes.


Encontro internacional da Via Campesina, em Maputo, Moçambique.

Os desafios do movimento camponês mundial.


A quinta conferência internacional de Maputo (Moçambique), do 19 ao 22 de outubro de 2008, foi precedida pela Conferência Internacional dos Jovens e a Assembléia das Mulheres.

No contexto atual de crises múltiplas – alimentar, financeira, energética e climática – as finalidades do projeto deste movimento, que conta já com 15 anos de existência, assumem uma nova significação. A lógica do desenvolvimento sustentável que inclui a possibilidade de reafirmar os direitos dos povos para produzir alimentos locais e sadios, e financeiramente a seu alcance, encontra um eco como nunca antes houve igual. É preciso ainda um esforço significativo para combater os APES (Acordos de Parceria Econômica) que facilitam o dumping e a superprodução industrial, como pleitear para relocalizar na escala do local, ancorada na capacitação local e a reforma agrária.

Essas questões foram discutidas nas sessões gerais e continentais pelos 500 delegados vindos para Maputo de todos os continentes. A conferência estava muito bem organizada, com uma equipe de 50 intérpretes coordenada pelo coletivo Lyre.

“A Via Campesina é um movimento internacional de camponeses, de pequenos e médios produtores, de sem-terra, de mulheres e jovens do meio rural, de povos indígenas e de trabalhadores agrícolas. Trata-se de um movimento autônomo, pluralista e multicultural, independente de qualquer organização política, econômica ou outra.

O principal objetivo da Via Campesina é de desenvolver a solidariedade e a unidade na diversidade entre as organizações de pequenos produtores, para promover relações eqüitativas entre os homens e as mulheres, assim como relações econômicas de igualdade e de justiça social, a preservação e a conquista da terra, da água, das sementes e dos outros recursos naturais, a soberania alimentar, uma produção agrícola sustentável assim como uma igualdade baseada sobre os pequenos e médios produtores.

A Via Campesina defende um modelo de agricultura camponesa e familiar baseada sobre a produção sustentável, com recursos locais e em harmonia com a cultura e as tradições das comunidades. Os camponeses e os pequenos produtores têm uma grande experiência ligada aos recursos disponíveis localmente. Eles estão aptos a produzir uma grande quantidade de alimentos de qualidade com muito pouco insumos externos. Nossa produção é principalmente destinada ao consumo familiar e os excedentes podem ser vendidos nos mercados locais.

A soberania alimentar é o DIREITO dos povos, dos países ou de grupos de países a definir suas políticas agrícolas e alimentares, sem fazer dumping em outros países. A soberania alimentar organiza a produção e o consumo alimentar conforme as necessidades das comunidades locais, dando a prioridade à produção para o consumo familiar e local. A soberania inclui o direito a proteger e regular a agricultura e a pecuária no nível nacional, e a proteger o mercado local do dumping dos excedentes alimentares e das importações a baixo custo vindo de outros países. Os sem-terra, os camponeses e os pequenos e médios produtores devem ter acesso à terra, à água, às sementes, aos meios de produção e a serviços de produção e a serviços públicos adaptados. A soberania e a sustentabilidade alimentares devem ser prioritárias em relação às políticas comerciais.

O modelo atual da indústria agroalimentar foi deliberadamente desenhado para uma integração e uma dominação vertical da agricultura. Este modelo explora os trabalhadores, e concentra o poder econômico e político no topo da pirâmide. A Via Campesina defende um modelo descentralizado em que a produção, a transformação, a distribuição e o consumo são controlados pelos povos, as próprias comunidades, e não por empresas transnacionais.”

Duas das decisões:

* A decisão de criar alianças estratégicas com outras organizações para aproveitar a crise internacional e avançar para um sistema mais sustentável, mais eqüitativo.

* A introdução de uma campanha para acabar com a violência imposta às mulheres (física, moral e institucional). Esta última campanha acontecerá conjuntamente com a Marcha Mundial das Mulheres, cuja Assembléia Geral aconteceu ao mesmo tempo na Galícia na Espanha.

A declaração final se encontra no link seguinte:
http://www.viacampesina.org/

Judith Hitchman, intérprete e membro do coletivo Lyre



Nossos Boletins estão presentes na WEB:
http://developpementlocal.blogspot.com/

http://www.apreis.org/


Agradecimentos aos nossos tradutores:

Éveline Poirier (Canadá) para o inglês, Brunilda Rafael (França) para o espanhol e Michel Colin (Brasil) para o português.
Entrar em contato conosco (para informações, novas assinaturas e cancelamento de assinaturas)
Yvon Poirier ypoirier@videotron.ca

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