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01/10/2006

Boletim Internacional de Desenvolvimento Local Sustentável
Boletim Informativo nº 32 – 1 de Outubro de 2006


Sumário

Mensagem da equipe editorial

Desenvolvimento Social sustentável e Trabalho em Rede
Contribuição de Rosemary Gomes (Brasil)

Novas políticas de ajuda ao desenvolvimento
Impacto sobre o desenvolvimento local sustentável

Duas informações breves
A Casa da Cidadania Mundial de Mulhouse (França)
Katrina um ano depois : mobilização popular para afirmar o direito ao regresso

Mensagem da equipe editorial
O último número suscitou numerosos comentários positivos e de encorajamento, a propósito dos artigos que se referiam ao trabalho em rede.
Rosemary Gomes do Fórum Brasileiro de economia solidária (FbES) fez-nos chegar um texto em português, que divulgou por diversas listas de difusão no Brasil e na América Latina. Reproduzimos esse texto pois ele traz-nos comentários e perguntas muito pertinentes.
O texto acentua o carácter essencial da circulação de uma informação produzida directamente a partir das práticas sociais dos actores do terreno. Transporta também um sinal de exemplo. Mas, mais do que tudo isso, acentua a necessidade de aprendermos a comunicar no essencial, através de termos compreensíveis para todos, aproximando os pontos de vista, para lá das ideologias: nas relações Norte-Sul, mas igualmente permitindo que as relações se tornem frequentes e duráveis entre os actores do Sul, objectivos que este Boletim também persegue. De facto, a informação, quando é partilhada pelos actores do terreno, multiplica-se, aumentando o poder de acção. O texto de Rosemary Gomes abre uma nova perspectiva de diálogo, estimulante pela sua lucidez. Felicitamo-la por isso.
Também desejamos despertar a vossa atenção para o impacto da denominada Declaração de Paris sobre as políticas de desenvolvimento. Esperemos que as instituições de desenvolvimento local, da economia social e solidária, se possam envolver neste debate, dado que existe um grave perigo para o papel da sociedade civil no desenvolvimento.
Suspendemos neste número,indefinidamente, o aparecimento da versão espanhola do Boletim. Renovamos pois o pedido a tradutores voluntários que possam assegurar designadamente a tradução para espanhol.

Francisco Botelho
Yvon Poirier
Martine Théveniaut

Desenvolvimento Social sustentável e Trabalho em Rede
Contribuição de Rosemary Gomes (Brasil)

O boletim sobre Desenvolvimento Local, na sua edição 31 traz um pontapé em questões que considero super importantes para atualizarmos nossos debates sobre as REDES e como os diversos atores sociais estão vivendo - atuando-militando nelas.
Indico a leitura atenta para aqueles que seguem o desenvolvimento da metodologia de atuação em redes e o fervilhar das novas conformações nos últimos anos, em especial na América Latina ...
Para aqueles preocupados em como poderiamos assegurar nossa fortaleza que é vista sempre pela diversidade (seja de atores, de bandeiras, causas ,movimentos sociais...) e ao mesmo tempo evitarmos a fragmentação, superposição de articulações, duplicidade de investimentos de recursos humanos e financeiros).
Acreditamos que realmente possamos atuar em colaboração; então a questão da complementaridade e integração (seja ela inter, intra, supra ) deveria avançar muito, não porque é legal ser solidário mas porque somente somando esforços conseguiremos causar alguma mudança na realidade.
Como trabalhar a nossa humanidade, relativizar egos, personalidades, e trazer a politica para o centro do debate? Lidar com culturas distintas, dialogar com o diferentes, como sempre diz Carola se aprende no caminhar juntos, mas politizar os processos é necessário, essa politização nos distancia da assistencia, das praticas compensatórias. O eco do sul fala em radicalizar....o do norte fala em incidir sobre as estruturas internacionais, mas no sul também existem atores que anseiam pela promoção (ou seja fomentar). Então estamos com dinamicas muitos distintas que se enlaçam na necessidade de apontar alternativas reais a outra forma de globalizar.
Para um desafio tão mega como o de globalizar a solidariedade acredito que teriamos que avançar para que tb os setores produtivos cooperativados fossem contagiados por essa vontade de cuidar de relações de cooperação internacional , de novo tipo, entre produtores que se vejam como atores de desenvolvimento, não apenas produtores ou e consumidores, mas seres portadores de direitos, deveres e força para construir novos territórios, novos mercados. Retirar o mito de Mercados existe e so restaria acessa-los, apresentar experiências onde eles nasceram da vontade de relações econômicas com ética e solidariedade. E isso não se dá de forma espontanea, e dai o papel das ONGs nesse processo das REDES e FORUNS nacionais e internacionais.
O tema da comunicação constante, fluente (em nossos varios idiomas e dialetos), transparente, frequente poderia dar pouco a pouco maior perenidade a processos e não a EVENTOS, mas quem financia dialogos que não sejam bilaterais? Em especial do sul com o próprio sul?
Apenas ressaltaria que comunicação não é necessariamente informação, conexão...
E informação pode ser repassada na forma bruta, usada ou descartada, vai depender do interesse e uso que se faça dela. Dai a retomada nas redes da necessidade de uma formação, o uso das novas TICs (tecnologias de informação e comunicação) não está sendo apropriada por aqueles que poderiam fazer um excelente uso dela, se necessita tempo e dedicação além do obvio financiamento para essa capacitação no uso de ferramentas.
Esse ano com uso do GNU (software livre) se fez coisas fantásticas voltadas para economia solidária, mas como elas ainda foram pouco apropriadas pelos seus possiveis beneficiários (sejam eles as cooperativas sejam os jovens que desenvolvem....)
Seria necessário uma resignificação desse conceito de informação na era digital e telemática?
As REDES necessitam tanto de encontros presenciais como mecanismos de comunicação, de criar laços de confiança, de ter face a face, olho no olho, ver os produtos, aprender uma técnica, conhecer a posição de cada um... daí depois para usar o skipe e as teleconferências ficou fácil e agilizou/economizou enormemente processos.
Mas ainda são poucos a dominar as ferramentas seja por capacidade técnica seja por afinidade, e ainda existem limites humanos a serem superados.
Mas é preciso já descentralização das informações e impedir que estejamos criando castas de "expertos" bem informados.
O que será que nossa base de lideranças da produção pensa do tal Altermundialismo? O que nos faltaria para lançar uma campanha, uma bandeira, uma causa (eu sei são muitas, mas teremos que priorizar e praticar esse internacionalismo) tenho certeza que não faltariam pernas, braços e vozes nos 5 continentes, está faltando direção política ao processo. Tirar a plataforma internacional do papel (pois ela já é nosso acordo mínimo e começar a unificar em ações concretos).
Parte da politização será enfrentar internamente nossas proprias ambivalências, temas como do padrão de consumo, seja no norte ou no sul por vezes são contornados porque criam impasses.. Deveria a Economia Solidária apontar mais radicalmente um modelo de produção determinado ou continuar mitigando as sequelas de um modelo insustentável? E a questão da precarização dos direitos sociais nos empreedimentos solidários? Falamos nos documentos sempre defesa dos DESC (ou DESCA), e o que significa isso para o campo da economia solidária? E o tema do financiamento ao desenvolvimento?
Qual é nossa agenda do desenvolvimento, ela tem um norte e um sul?
Não teria chegado o momento de começarmos a trabalhar INTER-REDES?
São apenas questões e duvidas que se reforçaram após a leitura desse Boletim.

Rosemary Gomes
FASE, FBES, FACES - Brasil
rgomes@fase.org.br

Nota : Na edição portuguesa mantenho o texto inicial de Rosemary, publicado no seu Boletim. Com a grafia brasileira para ser mais fiel. Deste texto fiz uma tradução para francês que deu origem a um novo texto, validado pela autora, com algumas diferenças na forma e na apresentação do conteúdo, mas que exprime, essencialmente, as mesmas ideias.
Esta nota torna-se essencial para aqueles que, lendo a versão francesa ou inglesa, possam estranhar a sua diferença formal.
Francisco Botelho

Novas políticas de ajuda ao desenvolvimento

Impacto sobre o desenvolvimento local sustentável
Está em curso um debate importante nos sectores de ajuda ao desenvolvimento, na sequência da adopção da Declaração de Paris, em Março de 2005.

As disposições da Declaração de Paris
Neste momento, mais de 90 Países doadores e Agências multilaterais já adoptaram esta Declaração que visa a eficácia das ajudas. A Declaração de Paris aspira a ser um passo significativo da comunidade internacional para reformar as modalidades de ajuda e concretizar os Objectivos do Milénio para o Desenvolvimento.

«Reconhecemos que atingir estes objectivos pressupõe um crescimento do volume das ajudas… mas um aumento significativo da eficácia das ajudas é também indispensável.” – Declaração de Paris

Esta Declaração assume cinco princípios para a eficácia das ajudas : o assumir das ajudas por parte dos países que as recebem ; alinhamento nas estratégias e nos procedimentos das instituições desses países ; harmonização e simplificação nos mecanismos das ajudas; gestão centrada nos resultados; responsabilização conjunta em função desses resultados.

À primeira vista, estes princípios parecem positivos porque colocam um pouco de ordem nas abordagens das ajudas e obrigam os países beneficiários a melhorarem a transparência, a gestão, etc. Por isso, a comunidade das ONG estiveram de acordo com eles.

Impactos diferentes
De qualquer modo, a Declaração de Paris possui lacunas graves que geram impactos cada vez mais importantes, e num número significativo de situações, efeitos negativos e perversos. Um primeiro efeito negativo surgiu com uma diminuição significativa dos orçamentos previstos para a gestão das ONG internacionais. Como as Agências dos diferentes países transferem directamente os fundos para os países beneficiários, os programas de apoio à sociedade civil, à organização comunitária e ao desenvolvimento local reduziram-se significativamente (em muitos casos mais de 50%). O que não é surpreendente, a Declaração de Paris não refere, uma única vez, o conceito de sociedade civil.
Em certas situações, estas novas orientações agravam os problemas já existentes. No decurso da Universidade de Verão organizada pelo Grupo de Economia Solidária do Quebeque (GESQ), Junho passado, representantes das ONG comunicaram-nos que as práticas de corrupção em alguns países beneficiários se agravaram com os novos princípios, que aumentaram as verbas em circulação pelos Ministérios. Uma ONG contou-nos que tinham sido escolhidos por um país do Sul para animar um programa de apoio à agricultura. No momento da assinatura do contrato, o Ministro perguntou: “O que me compete neste acordo?” Como a ONG recusou o suborno, não foi concretizado o contrato.

As ONG contestam
De qualquer maneira, a reacção torna-se cada vez mais forte. No Canadá, como noutros países, o conjunto das ONG e das organizações de desenvolvimento local contestam juntam das Agências respectivas. Sinal encorajador é de algumas Agências, como a Agência canadiana de desenvolvimento internacional (ACDI), reconheceram que ficaram muito longe na reorientação das suas práticas e que é necessário reintroduzir os programas de ajuda à sociedade civil e às práticas de desenvolvimento que se baseiam na apropriação das próprias populações locais.
O Centro de Estudos e de Cooperação Internacional (CECI), que tem uma longa experiência em desenvolvimento, afirma : O CECI constatou no terreno que a vitalidade e a diversidade do envolvimento civil são, quase sempre, a melhor das garantias para obter resultados, e não a acção dos governos. Nas comunidades carenciadas onde o apoio do Estado é frequentemente insuficiente e o investimento privado praticamente inexistente, O CECI desenvolve parcerias com as organizações que as populações criaram para assumir o seu próprio desenvolvimento.

Enfim, a situação é semelhante nos países do Norte e do Sul. Sem uma sociedade civil que se organiza para ganhar influência, sem uma implicação forte das populações nos bairros e nas aldeias, sem um assumir do seu próprio desenvolvimento, as grandes políticas governamentais, e todos os programas de apoio financeiro estão votados a reforçar os defeitos de uma abordagem que se centra quer no Mercado quer no Estado. A experiência mostra, seja qual for a diversidade das situações e o nível de pobreza, que o caminho do desenvolvimento tem que passar pelo terceiro pilar, a sociedade civil, e apoiar-se nos mesmos valores e práticas de “empowerment” (empoderamento), de participação cidadã e no assumir do desenvolvimento pelas próprias populações.


Yvon Poirier
A Declaração de Paris está disponível edm numerosas línguas no site Intermnet :
http://www.aidharmonization.org/
Site do CECI (françês, inglês e espanhol) http://www.ceci.ca/

Duas informações breves

A Casa da Cidadania Mundial de Mulhouse (França)
Situada nos confins das culturas suíça, alemã e francesa, a sua ambição consiste em demonstrar, no dia a dia e através de uma acção cidadã que não só um outro mundo é necessário como é tambérm possível. Como? « Ousando caminhar contra a corrente ». Juntando reflexão e experimentação. Um conjunto de temas, transversais à vida de cada um, é tido em conta: a cidadania, a economia solidária, a cultura, a educação popular, a vontade de se enriquecer através da diversidade, descobrindo raízes comuns e apoiando-se num espírito de solidariedade.

Alguns exemplos : a Casa da Cidadania Mundial acolhe Fóruns cidadãos todos os sábados de manhã e uma assembleia transfronteiriça anualmente. Em 2005, transformou-se no Centro Regional dos Cidadãos do Mundo e lançou o projecto dos jogos mundiais da paz. As actividades multiculturais multiplicam-se: escritor público, pedidos de asilo, procura de alojamento e de trabalho, refeições multiculturais, encontros temáticos, cursos de conversação francesa. Estas actividades devem-se principalmente ao JID (Justiça-Emigração-Direito) que é, a todos os títulos, um parceiro permanente e privilegiado.

No que se refere à Economia Solidária, a Casa Mundial da Cidadania assume projectos pontuais (restaurante solidário, charcutaria social, projecto de alojamentos solidários, uma boutique para nada, « Umsonstladen »), um Centro de Recursos e de Competências, uma parceria com o Banco de Projectos e o lançamento de uma base de dados, a tentativa de um mercado solidário (através de uma moeda complementar: o « Plus ») e… hoje, a possibilidade de um desenvolvimento ao nível da Região da Alsácia através do projecto SOL (Solidariedade).
« Trata-se de demonstrar através de experiências, projectos, reflexões, que a economia se tem de transforma em distributiva, tem de estar ao serviço do homem e não ao serviço do dinheiro e que a pessoa humana tem que ser tida em conta como pessoa e não como factor de produção.”
Resumo de Martine Theveniaut
Para saber mais : Email : mcm.arso@wanadoo.fr e r.winterhalter@wanadoo.fr

Katrina um ano depois : mobilização popular para afirmar o direito ao regresso
Em 29 de Agosto de 2005, o furacão Katrina abateu-se sobre a costa do Golfo do México com resultados catastróficos. Desde então, apenas as populações dos países pobres, como as do Bangladesh, tinham tido esta experiência! Depois da emoção e de uma primeira fase de confusão, a Administração Bush declarava que a América estava em condições de fazer face, sozinha, à catástrofe, e recusou a solidariedade de países como Cuba, disponíveis para enviar assistência sanitária de primeira urgência. Afirmava que 70% dos 100 mil milhões de dólares desbloqueados para a reconstrução já estão disponíveis. Mas a realidade é bem diferente. Um ano depois, as organizações estão em pé de guerra porque nada voltou a ser como antes. As iniciativas de solidariedade, as marchas, os protestos, as acções legais, as propostas de organizações de habitantes, os sindicatos, são classificados como coisas sem importância. Os testemunhos dos sobreviventes perante a Primeira Comissão Verdade, em Julho de 2006, esclarecem a situação: pessoas obrigadas a sobreviver com 123 dólares por mês, deslocadas milhares de quilómetros, outras desaparecidas. A grande maioria é pobre e afro-americana, 38 dos 47 distritos mais pobres de Nova Orleães foram destruídos pelo Katrina.
O primeiro aniversário do furacão foi ocasião de grandes manifestações para dar a conhecer a verdade aos Estados Unidos e ao mundo : Uma delegação de evacuados do Katrina vai estar em Genebra no Outono de 2006 para ouvir o relatório especial sobre a violação dos Direitos do Homem e a pobreza nos Estados Unidos, uma novidade para este Estado ; outras iniciativas estão programadas para 10 de Dezembro, dia Internacional dos Direitos do Homem. Finalmente, em Março de 2007, o Tribunal Internacional do Katrina será organizado por Black Activist Coalition on Katrina e por People’s Hurricane Relief Fund & Oversight Coaliton, precedido por uma Comissão Especial de inquérito internacional, composta por delegados da África do Sul, do Brasil, das Caraíbas, da Venezuela e de outros países.

Retirado de um artigo de Cesare Ottolini, Coordenador Internacional da Alliance of Inhabitants
Para saber mais : www.habitants.org Boletim nº 9, Setembro de 2006
Resumo de Martine Theveniaut


Os nossos boletins estão disponíveis na Internet:
http://desenvolvimentolocal.blogspot.com/
www.apreis.org/

Agradecimentos :
A Évéline Poirier do Canadá, pela tradução inglesa

Contacto (para informações, novas inscrições e desistências)
Yvon Poirier ypoirier@videotron.ca
Francisco Botelho frbotelho@mail.telepac.pt

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