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01/09/2006

Boletim Internacional de Desenvolvimento Local Sustentável
Boletim Informativo nº 31
1 de Setembro de 2006


Sumário
Mensagem da equipe editorial
Comunicação e utopia : promover a economia solidária Os desafios de trabalhar em rede

Construir redes : como ultrapassar os desafios? Algumas ideias

Anulação do 4º Encontro do RIPESSAviso das organizações belgas



Mensagem da equipe editorial
Classificamos este número como um número especial, tendo como tema as redes.

A anulação do encontro internacional do RIPESS que teria lugar na Bélgica no próximo mês de Abril, testemunha a dificuldade das redes europeias bem como de outros países, em manterem viva uma rede como o RIPESS. O próximo encontro é agora apontado para 2009, na Europa. Este tempo de pausa dá oportunidade de reflectir sobre as funções e as organizações das redes, bem como sobre o estabelecimento de redes na Europa, onde se levará a efeito o encontro em 2009.

O atelier Comunicação e Utopia : promover a economia solidária, para lá do encontro de Roanne de Junho passado, traz uma importante e considerável contribuição para o debate. O artigo de Yvon Poirier, membro da nossa equipe, por outro lado, aborda diversas questões práticas respeitantes à construção de redes.

No nosso ponto de vista, encontrar as formas adequadas para a organização em rede dos actores da sociedade civil é cada vez mais urgente tendo em conta que ela participa na construção de uma globalização mais justa, que integra as noções de desenvolvimento sustentável, de economia social e solidária, tudo a partir dos territórios locais. A sociedade civil está colocada perante o desafio de se afirmar como um « terceiro poder », mediando entre o económico e o político e trabalhando também com eles.

Temos no entanto de constatar que, apesar das nossas grandes ambições, a construção das redes internacionais ainda é balbuciante. Algumas redes e organizações são muito fortes em zonas como o Brasil, o Peru, a América do Sul, o Mali ou o Níger, em África, ou ainda no Canadá e na Bélgica no que respeita à economia social e solidária ou também na Índia no que se refere ao desenvolvimento comunitário. Apesar disso, ao nível internacional, as organizações actualmente existentes são muito frágeis, para lá dos seus próprios meios de acção.

A nossa contribuição gostaria de se revelar como um apoio aos militantes que, no dia a dia, nas suas próprias organizações, lutam contra estes desafios.

Este número será também o último produzido com o apoio de Anne Vaugelade na tradução para espanhol. Enviamos-lhe os nossos mais profundos agradecimentos e desejamos-lhe todo o sucesso nos seus futuros projectos.

E renovamos aqui o pedido a voluntários, designadamente no que se refere à tradução para espanhol. De qualquer modo, decidimos dar continuidade ao Boletim mesmo em três línguas (francês, inglês e português), enquanto aguardamos uma solução para conseguir a tradução em espanhol.

Francisco Botelho
Yvon Poirier
Martine Théveniaut


Comunicação e utopia : promover a economia solidária Os desafios de trabalhar em rede

O GRIL, (Grupo de Pesquisa em Iniciativas Locais - Groupe de Recherche sur les Initiatives Locales) da Universidade de Saint-Etienne (França) levou a efeito em 23 de Junho de 2006 um colóquio internacional do mundo francófono sobre “Comunicação e utopia: promover a economia solidária”. A participação foi intensa ao longo de todo o dia, envolvendo cerca de cem pessoas. Seis meses após o 3º Encontro Internacional da globalização da solidariedade, em Dacar, quais são as dificuldades, teóricas e práticas, com que se deparam os actores e promotores da economia solidária? Como manter viva, no interior das próprias organizações, a utopia solidária ?

A diversidade das situações A parte da tarde foi consagrada a trabalhos em grupo Um deles foi consagrado à “utopia em rede: animar uma rede de economia solidária”. E a primeira constatação é a de que o tema está em moda. Um novo remédio milagre contra os isolamentos? Alguns participantes integram redes de proximidade que se organizam para a auto-produção e a construção ecológica e analisaram em conjunto os sucessos e os fracassos. Uma coordenação de comércio justo testemunha os problemas de coesão interna que são provocados por divergências de pontos de vista. Outros descrevem situações de animação a uma escala maior – nacional, europeia e internacional. Colocam o problema do funcionamento através de grandes espaços geográficos e a maior ou menor afinidade em ideias e expectativas operacionais.

Uma tentativa de definição do termo « rede » A definição proposta por Laurent Fraisse, pesquisador e coordenador do Pólo sócio-económico solidário internacional (PSES) é a seguinte : « forma de organização estabelecida para levar a cabo uma acção colectiva, baseada em relações horizontais, personalizadas e de confiança. São mais ou menos formais. A legitimidade de uma rede resulta da participação efectiva em projectos, em acções. O funcionamento depende frequentemente da mobilização pontual no decurso da sua vida ou das actividades de informação, de promoção e de execução de uma determinada acção em particular”. É a intensidade das relações de uma rede e a sua qualidade que melhor traduzem a eficácia de uma organização em rede. Embora as relações sejam mais ou menos intensas conforme as circunstâncias, reformulam-se de acordo com os objectivos do projecto. Condição sine qua non do sucesso de uma rede é a mutualização dos recursos (informações, relações, recursos…) o que se torna muito difícil no concreto.

Porquê uma rede : objectivos e realidade Eric Lavillunière, na sua apresentação, baseou-se na sua grande experiência de animador de redes, uma rede francesa de economia alternativa e solidária (MB 2), a Confederação europeia das cooperativas de produção (CECOP) e, actualmente, ao Instituto Europeu de Economia Solidária (INEES), no Luxemburgo. Evidenciou a razão de ser da organização em rede : dar visibilidade, partilhar os avanços das diversas práticas, construir um movimento, encontrar ligações e, evidentemente, conhecer bem e ligar-se ao terreno, fazer circular as informações…

No concreto, as organizações em rede, quer sejam formais ou permaneçam informais, tendem a reproduzir a centralidade. A vitalidade democrática interna é frequentemente frágil, já que o cuidado com as relações humanas entre os diversos componentes, raramente é financiado. A animação, o retorno às bases, os relatórios, a circulação dos intercâmbios tomam um tempo considerável. A diferença entre os que têm acesso às informações e às oportunidades e todos os outros que apenas têm uma informação periódica de que não podem tirar grande proveito, tende a crescer. A tendência para se tornar « consumidor » da rede ou de permanecer à espera dos meios, pode sobrepor-se à participação activa. As formas de funcionamento em rede são complexas, com formas diversas de acesso e diferentes interdependências. O controlo tende a concentrar-se sobre algumas cabeças apenas. As responsabilidades nas estruturas dirigentes das redes permanecem ocupadas pelas mesmas pessoas, quer se tratem de grandes federações postas em funcionamento nos anos 50 e 60, quer nas redes mais recentes provenientes da economia social e da economia solidária.

Um outro perigo é a especialização. O sistema de atribuição de meios no contexto dos recursos especializados tende a sobrepor-se ao projecto interno, as formas de concorrência entre as condições dos diversos protagonistas, mesmo entre redes do mesmo movimento, contribuem para inspirar mais suspeita do que confiança. O que impede o benefício conjugado de uma capitalização de capitalizações entre as organizações. Nada facilita a transversalidade, as abordagens sistemáticas que permitiriam orientar as actividades para uma leitura política, que encorajariam a prospectiva e o questionamento para lá do campo de intervenção de cada rede.

E onde fica a utopia em tudo isto ? Em “como” uma organização em rede pode testemunhar que está, acima de tudo, ao serviço das finalidades de uma economia mais solidária.
A crise da participação e da representação afecta os partidos, os sindicatos e os sistemas de delegação e de mandato, em geral. Esta crise de confiança não se estende às redes de economia solidária. Fazem a diferença? O conteúdo das finalidades tem seguramente a sua importância, mas a forma como se traduzem nas diferentes formas de organização, o exercício dos mandatos, a transparência do funcionamento também. O debate mostrou que muitos dos actores não esperam mais « do que isso chegue de cima », que « o grande ser » já não está no sacrifício do presente em função dos fins últimos. “A utopia, talvez seja apenas fazer aquilo que afirmamos desejar fazer” Mais vale então agora perder tempo a identificar o que nos atrasa, a definir os desacordos e compreender o seu significado, a estabelecer os mandatos e como deles dar conta, para crescer em poder de acção e de influência. Rapidamente, conseguir a captação pessoal de recursos colectivos, causa frequente da degeneração e posterior morte das redes.

Passar do « ideal » à concretização de uma acção colectiva em rede ? Isso implica prestar tanta atenção aos processos como aos resultados que se pretendem obter. As formas de representatividade estão ainda por construir. Não podemos definir “regras de jogo”. É preciso aceitar as dificuldades de compreensão inerentes às distâncias geográficas, às culturas, às línguas. É também necessário traduzir em actos, e no que diz respeito ao acesso aos recursos, a vontade de distanciamento de sistemas sociais que produziram e produzem todos os dias a dominação dos centros sobre as periferias, como a predominância do discurso do Norte sobre o do Sul, dos homens sobre as mulheres nos postos de responsabilidade, do valor das afirmações dos adultos sobre as novas gerações, dos peritos sobre os vulgares cidadãos voluntários. Como construir um terceiro poder de uma forma democrática? Não podemos desistir das utopias concretas, já que os resultados que elas virão a conseguir guiarão os passos da nova geração que chega ao governo do mundo.

Martine Theveniaut
Notas de participação no atelier e documento de intervenção de Eric Lavillunière.

Actas a surgir (apenas em francês). Dirigir-se a IUT de Roanne, Communication, 20 avenue de Paris, 42334 Roanne cedex. Contacto email: dacheux@univ-st-etienne.fr



Construir redes : como ultrapassar os desafios? Algumas ideias

A construção de redes internacionais desenvolveu-se significativamente nos últimos dez anos para possibilitar uma globalização alternativa. Pessoalmente implicado em diversos projectos, gostaria de trazer uma contribuição baseada nesses dez anos de experiência.

Partilho inteiramente as ideias avançadas no decurso do atelier do colóquio de Roanne (ver artigo neste número). Por outro lado, a minha experiência dos últimos anos, quer no Quebeque quer na Europa, levam-me a prosseguir com a reflexão, designadamente no que respeita aos desafios práticos que se torna necessário ultrapassar. Particularmente, desejo retirar as lições dos fracassos na construção de redes e de organizações, na esperança de que outros as possam evitar nos seus próprios projectos.

Primeira constatação : deficiente preparação A maioria das organizações em que estive implicado nasceu de forma espontânea. Frequentemente apenas porque a ideia, em si, parecia suficientemente boa para congregar as pessoas que partilhavam um mesmo ideal. Mas toda a literatura sobre a questão aponta para um primeiro estudo de viabilidade que assegure a partilha por todos dos mesmos objectivos e valores, o que evita futuros mal entendidos e confusões.

Segunda constatação : subestimar as dificuldades práticas Os desafios do trabalho em rede internacional são enormes, sobretudo se o projecto necessita de ser trabalhado em várias línguas e em várias regiões do mundo. Se a questão não é colocada frontalmente desde o início e se não existem meios para ultrapassar esses desafios, a vida da rede será deficiente. O desinteresse dos membros leva-os depressa a afastarem-se.

Terceira constatação : ultrapassar a etapa da organização de encontros Muitas organizações e redes foram criadas, ou anunciadas, no decurso de encontros nacionais e internacionais. Essas ocasiões fazem nascer solidariedades intensas e o sentimento de poder trabalhar na construção de um mundo melhor. Mas a experiência mostra que é muito mais fácil mobilizar as pessoas para a participação destes grandes encontros do que fazer viver quotidianamente uma rede. De regresso aos seus países e organizações, poucos participantes têm tempo para se dedicarem à causa. E surge o dilema: uma rede para organizar encontros, ou encontros para consolidar e desenvolver redes? Salvo se a razão de ser é a de criar condições para a realização de encontros, como o FSM, uma rede que não viva senão para a organização de encontros, está condenada ao fracasso.

Quarta constatação : a insuficiência de recursos humanos e materiais Há três fontes possíveis de financiamento : os associados, os governos e as ONG (ou fundações). Algumas redes tiveram sucesso em alguns países e apesar das dificuldades, ao conseguirem combinar diferentes fontes de financiamento. Pelo contrário, outras organizações cessam a sua actividade por causa da falta de financiamento, independentemente de serem portadoras de uma visão e de um conjunto de valores pertinentes. Esse foi o caso da organização europeia DELOS, dissolvida em 2003.
No caso das redes internacionais, os desafios são ainda maiores. O financiamento proveniente dos seus associados ou dos governos (excepto para a realização de encontros) é praticamente nulo. Assenta essencialmente em parcerias com ONG internacionais. O que implica um trabalho significativo na condução da parceria para garantir a independência e autonomia da rede. É pois importante que a rede e as ONG estejam de acordo nos objectivos e nos projectos, bem como nas actividades a desenvolver.
A montagem de uma equipe de coordenação e de animação dedicada a assegurar as actividades da rede é uma condição essencial para um funcionamento normal. Essa equipa pode ser centralizada ou descentralizada, mas necessita sempre de meios essenciais.

Quinta constatação : dificuldades na vida associativa Todos sabemos que uma sã vida associativa é um desafio constante. E os desafios tornam-se ainda maiores ao nível das regiões e dos países. As dificuldades ligadas à distância implicam a necessidade de recursos óbvios. A passagem ao nível internacional aumenta as dificuldades porque os momentos de encontro são mais espaçados e é necessário trabalhar em diversas línguas.
De qualquer maneira, estes desafios não são inultrapassáveis. Os meios de comunicação electrónica contribuem para combater estes desafios desde que haja um nível de recursos suficiente e que a equipe dirigente torne prioritária a circulação de informação.
O tipo de direcção política que a rede venha a assumir tem necessidade de ser muito bem discutido previamente. Particularmente, é necessário ter em conta a sua especificidade, face a organizações mais hierárquicas e verticais, que não deve pretender reproduzir. Parece-nos que a direcção de uma rede deve necessariamente ser colegial e descentralizada.

Em conclusão, é importante sublinhar que a enumeração dos desafios não pretende desencorajar, pelo contrário. Continuo convencido que a construção de redes nacionais e internacionais é uma necessidade incontornável para a construção de uma globalização mais justa e solidária. Estas constatações destinam-se a facilitar a acção e a evitar os escolhos. Porque é precisamente por a missão ser tão importante que é essencial concretizá-la bem. Os nossos meios são limitados e não podemos permitir-nos o desperdício de energias. Muitas associações e redes terminaram a sua actividade por não terem levado em linha de conta de uma forma séria, as dificuldades que seria necessário ultrapassar.

Resumindo, três questões se colocam essencialmente : Quem? O quê ? e Como ? Aqueles e aquelas que, como nós, se colocam na perspectiva de construir uma globalização alternativa, estão facilmente de acordo no Quem e nO quê. De qualquer maneira, a minha experiência dos últimos dez anos ensinou-me que, na maioria dos casos, as discussões sobre o Quem e O quê são, é certo, discussões sobre ideias e princípios interessantes, mas que não chegam. Não consagramos tempo suficiente a pormo-nos de acordo sobre o Como. Remetemos a questão para mais tarde. Conheci mesmo organizações que proclamaram a sua existência sem nenhuma discussão sobre o Como. O que explica em boa parte alguns fracassos de que temos sido testemunhas.

Para assegurar a perenidade das redes é necessário preocuparmo-nos tanto com o Como como com o Quem e O quê.

Yvon Poirier


Anulação do 4º Encontro do RIPESS Anúncio da organização belga

SAW-B e VOSEC, as duas organizações que previam montar o 4º Encontro internacional da globalização da solidariedade em Abril do próximo ano (ver os nossos números anteriores), anunciaram que não será possível reunir as condições necessárias para a concretização do evento.

Entretanto, esperam poder estar em condições de levar a efeito o 4º Encontro num outro país europeu, em 2009.

Outras informações em próximos números.

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Os nossos boletins estão disponíveis na Internet:
http://desenvolvimentolocal.blogspot.com/
www.apreis.org/

Agradecimentos :
A Évéline Poirier do Canadá, pela tradução inglesa
A Anne Vaugelade, de França, pela tradução espanhola

Contacto (para informações, novas inscrições e desistências)
Yvon Poirier ypoirier@videotron.ca
Francisco Botelho frbotelho@mail.telepac.pt

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